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sábado, 9 de abril de 2011

A SORTE LANÇADA EM 60 SEGUNDOS DE ENTREVISTA

Pesquisa americana diz que primeiro minuto é crucial para o candidato causar boa impressão.
Para o Valor, de São Paulo
Inúmeros são os candidatos que batem à porta de Célia Alves, diretora de produtos de uma multinacional do setor de cosméticos, em busca de uma colocação profissional na empresa. Poucos, porém, são os que acertam o tom da abordagem e fazem com que a executiva deixe sua atribulada agenda de lado para dedicar algum tempo à mensagem recebida. Graças a um desses e-mails criativos, em forma de currículo, Célia descobriu sua mais nova gerente comercial, no cargo há pouco mais de seis meses.Segundo ela, a abordagem dessa profissional foi ousada a ponto de revelar de forma clara que o perfil que buscava estava descrito naquelas linhas. "Entre outras coisas, ela dizia na mensagem ‘precisa de alguém para apontar soluções na área comercial? Se precisa, acaba de encontrar’. Logo no início da entrevista, soube que havia acertado em chamá-la", diz Célia.O caso exemplifica como o primeiro instante do processo seletivo pode ser mais valioso do que se pensa. Uma pesquisa feita com headhunters pela Sociedade Americana de Psicologia ( American Psycological Association – APA), com sede em Washington e mais de 150 mil profissionais associados, todos ligados às principais universidades do país, acaba de ser divulgada e desvendada a importância do contato travado entre entrevistado e entrevistador nos segundos que marcam o começo do encontro.A dinâmica do estudo era simples: simulações de entrevistas, entregues aos recrutadores numa fita de vídeo, para análise individual de cada um. Coube aos 60 participantes apontar quem contratariam. Todos assistiram aos primeiros 20 minutos das conversas para fazer a escolha. Depois, reviam os 15 segundos iniciais da entrevista e o resultado da escolha foi idêntico. Tamanha surpresa dos psicólogos batizou esse comportamento de efeito-surpresa. Razão simples: quando o profissional causa impacto positivo nos primeiros 60 segundos da entrevista tudo o que diz e faz depois apenas reforça a opinião que o avaliador forma no primeiro minuto.A teoria encontra respaldo não só no exterior. Luciana Sarkozy, sócia-diretora do Career Center, empresa especializada em aconselhamento de carreira, lida com contratações em seu dia-a-dia. Para ela, mestre em psicologia social pela Universidade de São Paulo (USP), a química inicial pode, de fato, definir todo o processo de seleção. " Se não existe empatia não há razão para dar continuidade a um recrutamento", diz. "Essa percepção se dá independentemente do método utilizado para contratar, que tem peso, não há dúvida, mas a química pode ser considerada uma espécie de bússola na hora em que se escolhe um profissional".Na opinião de Luciana, seja a entrevista técnica, intuitiva ou por competência, a afinidade será sempre um importante quesito levado em consideração por parte de quem contrata. Não à toa quem passa pelos treinamentos do Career Center recebe orientação acerca de como portar-se durante uma entrevista. " O candidato deve ter em mente que cabe a ele igualmente facilitar a interatividade", diz. Para Luciana, isso não significa falar em demasia ou parecer artificial, apenas fazer comentários capazes de tornar o momento tenso num papo agradável. "Ajuda a reforçar a empatia, invariavelmente observada por quem entrevista".
Nos 60 segundos cruciais, portanto, é indicado falar sobre si mesmo. "Afinal, o avaliado está ali para conhecer o candidato", diz Luciana. Para isso, é importante empregar com naturalidade a primeira pessoa, usar "eu" ao falar de si próprio e adotar "nós" e "time" quando se referir ao grupo com o qual trabalhou. " O melhor dos conselhos é usar o bom senso". Outro ponto observado pela executiva mostra que, o inverso, ou seja, a falta de empatia, ocorre na mesma proporção. "Não são raros os casos de pedido de demissão que acontecem por falta de afinidade. São muito comuns quando há troca de chefia e fusão."Luciana não é a única a endossar a teoria americana. Wilson Soderi, diretor comercial da Revlon Cosméticos, defende a tese mas faz algumas considerações. "Somente a prática permite ao recrutador desenvolver técnicas não verbais apuradas o suficiente para interpretar o candidato num primeiro momento", diz.Esse especialista na arte de recrutar sabe que é necessário destrinchar pelo menos três elementos durante um processo de recrutamento: o social, o educacional e o profissional. "Tanto quem recruta quanto quem aspira pela posição tem pouquíssimo tempo para expor, o que significa, além de falar, ler de forma subliminar o que se tem para dizer, daí a relevância da primeira impressão".Com tal competência desenvolvida, Soderi perdeu a conta de quantas pessoas conseguiu captar a essência num primeiro momento. "É gratificante constatar o acerto de um feeling que surge durante a entrevista, por se tratar de um momento em que entrevistador tem nas mãos não só o destino da empresa como o de uma pessoa", diz ele. "Uma intuição errada e lá se vão por água abaixo resultados, metas e sonhos pessoais".José Francisco da Silva, diretor de recursos humanos para América Latina da Novell, empresa de softwares e soluções para rede, é outro executivo que lida com recrutamento em sua rotina diária. No início do ano, por exemplo, recebeu a missão de preencher a função de diretor comercial da Novell. Silva percorreu os procedimentos exigidos pela companhia para chegar ao candidato ideal: avaliou currículos encaminhados pelos headhunters, analisou os testes grafológicos aplicados, para então, marcar a entrevista com três pessoas. "Sabia quais eram as competências necessárias para a vaga e tinha em mente o que deveria falar para extrair do candidato as informações capazes de identificá-las", diz ele.Segundo o diretor de RH, esse processo o surpreendeu, uma vez que, ao conversar com o segundo candidato teve a certeza de que era a pessoa quem buscava. "Intuição aliada à técnica", diz ele sem esconder que, de fato, a contratação foi certeira. Talvez no inconsciente de cada recrutador esteja presente a máxima grafada em um dos livros de Artur da Távola: "Afinidade é um sentimento singular, discreto e independente. Pode existir a quilômetros de distância, mas é adivinhado na maneira de falar, de escrever, de andar, de respirar".

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